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terça-feira, novembro 26, 2024
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A Sereia do Pirapora

Muito antes da cidade de Pedro II ter esse nome, na região do olho d’água Pirapora, havia poucas casinhas. Em uma delas vivia um casal com sua única filha, Helena, uma bela moça na flor da idade.

 

Helena era muito obediente aos pais e sua mãe tinha orgulho dela, mas pelo fato de haver tido a filha quando já estava quase desacreditando de que um dia seria mãe, fazia mimos à menina, o que não atrapalhou em nada sua criação.

Trabalhadeira, a moçinha fazia de um tudo dentro de casa e ainda ajudava o pai na roça nos trabalhos mais leves. Também ajudava a mãe com a lavagem da roupa. Para isso acompanhava a mulher em suas idas ao Pirapora. Na volta, com a roupa dentro de uma trouxa, subia pelo paredão do Pinga, por uma veredinha íngreme de dar medo.

Pois naquela Sexta-feira Santa à tardinha os pais de Helena se arrumaram e convidaram a filha para irem visitar uns parentes que moravam do outro lado da cidade. Qual não foi a surpresa do casal quando a menina balançou a cabeça e com ela a bela cabeleira preta dizendo que não iria. Em seguida correu para junto da mãe e lhe beijou as mãos pedindo para não ir.

A mulher a princípio nem admitia que Helena ficasse sozinha em casa, mas constatando que o marido parecia consentir com a cabeça, também resolveu acatar o pedido da menina. Helena era uma filha tão boa, que não custava nada fazer a vontade dela algumas vezes.

E enquanto seus pais se despediam dela e ela tomava a benção a um e a outro, beijando-lhes as mãos, não se continha de felicidade e procurava esconder isso da mãe porque, afinal, ela poderia se arrepender e a levaria à força.

Foi, portanto, um alívio para o coração de Helena quando os pais sumiram na curva da vereda que dava para o rumo das casas dos parentes. Helena deu pulinhos de alegria e mais do que ligeira correu até à cozinha, pegou uma cabaça de carregar água e uma rodinha e desceu no rumo do riachinho Pirapora.

Já eram quase seis horas da tarde e o sol tombava por detrás do morro fazendo com que o riacho lá embaixo virasse ouro derretido. As mangueiras com suas altas copas, pendidas por sobre o talhado do Pirapora, tudo aquilo tangido por uma brisa mansa e musicado pelo barulho das águas nas grotas.

Helena começou a descer pela vereda que dava até lá embaixo. Numa Sexta-Feira Santa não havia viva’alma por ali, de modo que ela poderia se encontrar com o pássaro encantado com quem tanto sonhara nos últimos dias desde que o vira à tardinha quando quase não havia mais ninguém por perto.

Estava distraída brincando com umas pedrinhas na beira do riacho, com os pés descalços se refrescando quando, de repente, ouviu o mais belo canto que alguém já ouvira antes. Ao levantar os olhos avistou aquele pássaro lindo, de plumagem furta-cor que parecia encará-la.

Não teve dúvidas, mais que depressa levantou-se da pedra à beira do rio, despiu-se das vestes, pois não queria molhá-las e sua mãe desconfiar de que ela havia saído durante sua ausência, começou a caminhar na direção do pássaro. O riachinho era raso, portanto não haveria perigo. Mas quando já estava a meio caminho, a menina deslizou em uma pedra com lodo, se desequilibrou e caiu batendo com a cabeça em outra pedra e desmaiando. Helena afogou-se, pois não havia ninguém ali para ajudá-la.

Quando seus pais retornaram já à noite e não encontraram a filha em casa, se desesperaram. Passaram o resto da noite junto com os vizinhos procurando a moça e nada. As buscas prosseguiram no dia seguinte e no outro e no outro até que, aos poucos, as esperanças foram se esvanecendo.

Dizem que o pai de Helena morreu de desgosto anos mais tarde. A mãe dela trazia, pelo resto da vida, a única fotografia da filha amada em uma carteirinha que apertava contra o peito antes de dormir. A pobre mulher morreu velhinha, mas por todos os dias do resto da vida dela lembrava-se da querida filha.

O tempo passou. Uma certa madrugada de lua cheia, um morador das bandas do Pirapora acordou e como ouvisse uma canção plangente resolveu levantar-se à procura de sua fonte.

Qual não foi sua surpresa quando ao aproximar-se do talhado magistralmente banhado pela luz do luar avistou lá embaixo, no riachinho Pirapora a silhueta de uma sereia cantante com um pássaro emplumado pousado em uma de suas mãos, tudo envolto por uma cintilante campânula de luz.

Ernâni Getirana é professor, escritor e poeta. Autor do livro “Lendas da Cidade de Pedro II”. Escreve às quintas para esta coluna.

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