O surto de uma pneumonia misteriosa que começou no norte da China agora se espalha por países da Europa, como Holanda e Dinamarca, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) e dados de órgãos de saúde desses países. Crianças são as principais afetadas. Mas há risco de a doença chegar ao Brasil?
Após as primeiras informações sobre o surto terem sido divulgadas, no fim de novembro, chegou-se à conclusão de que a causa da pneumonia misteriosa é uma infecção causada pela Mycoplasma pneumoniae, bactéria comum e presente em diversos países.
Ela leva a quadros gripais e sintomas similares aos de uma infecção causada por vírus, como influenza, coronavírus e vírus sincicial respiratório (VSR). Diferentemente de outras bactérias, que geralmente se espalham por contato com água, secreção, alimentos e objetos infectados, a Mycoplasma pneumoniae se propaga pelo ar. Por isso é tão contagiosa quanto outros patógenos gripais.
Segundo Julio Croda, médico infectologista da Fiocruz e professor da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), esse agente pode causar uma pneumonia bacteriana, distinta das que os médicos estão mais acostumados a tratar.
“Essa bactéria provoca normalmente surto a cada um ou três anos, com aumento no número de casos, só que não na magnitude que a gente tem visto agora”, diz Croda. “É mais comum em crianças de 5 a 12 anos, enquanto o VSR atinge principalmente as de até 5 anos.”
Para Julio Croda, as probabilidades de um surto de Mycoplasma pneumoniae chegar ao Brasil são grandes.
A OMS atribui o aumento dos casos de infecção pela bactéria à reabertura integral das escolas e à diminuição das medidas de isolamento social após o período de pandemia de Covid-19. A maior ocorrência de quadros graves, representados pela pneumonia, ocorre pela menor resistência criada pelas crianças nos últimos anos. Algumas não conviveram tanto com outras pessoas e crianças, além das de sua família, e tiveram pouco contato com vírus e bactérias.
“Também tivemos a retomada das escolas, com crianças mais suscetíveis, o que nos levou a surtos do vírus sincicial respiratório, por exemplo. Então, tudo indica que podemos ver um aumento de casos do Mycoplasma pneumoniae também”, diz Croda.
De acordo com o especialista, um grande desafio no Brasil é que não há testagem em massa para a identificação desse agente, o que dificulta o tratamento correto em casos graves e o monitoramento de um possível aumento no número de infecções.
“Seria interessante, no momento em que há aumento de casos em outros países, a gente testar nos quadros de internação, para monitorar a doença no Brasil e tratar os pacientes mais efetivamente”, afirma.
Mesmo assim, Croda diz que não há motivo para desespero. A Mycoplasma pneumoniae costuma provocar sintomas gripais leves e, quando chega ao estágio da pneumonia, pode ser tratada com antibióticos.
O Brasil tem a medicação disponível e também o teste que detecta a bactéria. Por isso, a recomendação é que os especialistas de saúde do país estejam atentos à possibilidade de surto e peçam o teste, para diagnosticar e tratar corretamente os pacientes internados.
Os sintomas da infecção por Mycoplasma pneumoniae são os mesmos de uma gripe: coriza, dor de cabeça e de garganta e febre. Mas há uma característica bastante comum nesses quadros: a presença de tosse seca. De qualquer forma, o diagnóstico só pode ser feito por meio de teste, pois não é possível fazer uma diferenciação precisa em relação a outros tipos de patógenos gripais somente pelos sintomas apresentados.
O tratamento também é o mesmo indicado para outros agentes gripais. Deve-se usar medicamentos que combatam os sintomas, como antitérmicos e analgésicos, além de cuidar da hidratação e da alimentação. Se o quadro evoluir para grave e demandar hospitalização, é necessário internar e, após testar, fazer tratamento com antibiótico.