O ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), votou hoje (13) para condenar Aécio Lúcio Costa Pereira, primeiro réu a ser julgado pela invasão e depredação de prédios públicos durante os atos golpistas de 8 de janeiro.
Como está o julgamento
Em um voto duro, Moraes afirmou que os crimes foram cometidos por uma “turba golpista” e se tratou do ápice de uma escalada violenta que começou logo após o resultado das eleições. Relator, o ministro foi o primeiro a votar nesta quarta-feira. Ainda restam os demais integrantes da Corte.
Pelo voto de Moraes, Aécio Lúcio Costa Pereira, de 51 anos, responderá pelos crimes de abolição violenta do Estado de Direito, golpe de Estado, dano qualificado por meio de violência e grave ameaça, deterioração do patrimônio tombado e associação criminosa armada.
Ele também estipulou uma multa coletiva por danos públicos no valor total de R$ 30 milhões, a ser paga, se sua decisão for corroborada pela maioria dos ministros, por todos os condenados pelos atos golpistas.
Fotos e vídeos durante voto
Em um movimento inédito para uma ação penal no Supremo, Moraes exibiu fotos e vídeos da invasão ao prédio da Corte e do Congresso durante a leitura de seu voto. O instrumento já foi acionado antes, mas em outros tipos de processos na Corte.
Enquanto as imagens eram transmitidas, o ministro reforçou que se tratou de atos atentatórios à democracia comandada por uma “turba de golpistas”. As imagens foram transmitidas pela TV Justiça ao longo da sessão.
“Não estavam com armamento pesado, com fuzis, mas estavam numericamente agigantados e a ideia era que, a partir dessa destruição, com essa tomada dos três prédios, houvesse a necessidade de uma GLO [Garantia da Lei e da Ordem]. E, com isso, estavam pedindo que as forças militares, principalmente o Exército, aderissem a esse golpe de Estado.” – Alexandre de Moraes, ministro do STF
Moraes também exibiu três vídeos gravados e divulgados pelo próprio réu, Aécio Lúcio Costa Pereira, durante a invasão ao Senado Federal.
Em uma das cenas, Aécio está na mesa diretora do Senado durante o quebra-quebra. Em outra, ele fala no parlatório da Casa e diz que não aceitará o “governo fraudulento” de Lula (PT) e que “não deixará o comunismo entrar”.
“Isso é um passeio pacífico, presidente?”, ironizou Moraes.
Escalada da violência e aceno ao Exército
Moraes também apontou que o 8 de janeiro foi a culminação de uma “escalada golpista violenta” que ocorreu no país desde as eleições, citando a tentativa de caminhoneiros de bloquear rodovias no país, a tentativa de explosão de uma bomba no aeroporto de Brasília e os ataques à sede da Polícia Federal, em dezembro do ano passado.
O ministro ainda criticou a omissão das forças de segurança e disse que, se houvesse dois batalhões de choque da Polícia Militar na praça dos Três Poderes, as invasões não teriam ocorrido.
“Houve omissão de autoridades e essas autoridades, várias estão presas, estão sendo investigadas e outras foram denunciadas”, afirmou.
Moraes fez um aceno ao Exército em seu voto ao falar que a força “não faltou” com a sociedade brasileira ao não aderir ao golpismo.
“O fato de eventuais militares estarem sendo investigados não macula uma verdade histórica que deve ser proclamada. O Exército não aderiu a esse devaneio golpista, inclusive de políticos, que estão sendo investigados.” – Alexandre de Moraes, ministro do STF
Crime de multidão
O ministro começou a votar ainda no final da manhã, rejeitando as alegações da defesa de Pereira de que ele deveria se declarar suspeito ou que o caso não deveria tramitar no Supremo.
Moraes citou “negacionismo” e “terraplanismo” e que a defesa do réu tenta fazer parecer que o 8 de janeiro foi um “domingo no parque”.
“Então as pessoas vieram, as pessoas pegaram o ticket, entraram na fila, assim como fazem no Hopi Hari, em São Paulo, ou na Disney. Agora vamos invadir o Supremo, vamos quebrar uma coisinha ali. Agora vamos invadir o Senado, agora vamos invadir o Planalto”, ironizou Moraes.
O ministro defendeu que o crime cometido pelos réus foi multitudinário, ou seja, praticado por uma multidão que deve responder pelo resultado causado. As defesas questionavam a ausência de individualização da conduta de cada acusado.
“Houve dolo, uma clara intenção de uma invasão criminosa no caso dos autos no Senado Federal para tomada ilícita do poder, pleiteando uma intervenção militar e para isso utilizando-se de violência juntamente com os demais e a destruição”, afirmou o ministro.
“A tentativa de morte da democracia não é pacífica. É um ato violentíssimo contra o Estado democrático de Direito.” – Alexandre de Moraes, ministro do STF
Quem é o primeiro réu
Aécio Lúcio Costa Pereira, de 51 anos, é de Diadema (SP). Durante a invasão, ele gravou um vídeo enquanto estava na mesa diretora da Casa. Ostentando uma camisa com os dizeres “intervenção militar federal”, ele se dirigiu aos “amigos da Sabesp” no vídeo, que foi exibido durante a sessão.
Pereira acabou preso pela Polícia Legislativa dentro do próprio plenário e continua detido nove meses depois. Já em janeiro, ele foi demitido da Sabesp.
“Amigos da Sabesp: quem não acreditou, tamo aqui. Quem não acreditou, to aqui por vocês também, porra! Olha onde eu estou: na mesa do presidente.”
Aécio Lúcio Costa Pereira, réu por invadir o prédio do Senado
Em depoimento, ele negou que tenha participado do quebra-quebra.
No plenário, o advogado Sebastião Coelho da Silva, que representa Aécio, afirmou que o julgamento era “político” e disse que o Supremo não deveria julgar o caso.
“Aqui nesta Corte estão as pessoas mais odiadas do país. Vossas excelências têm que ter a consciência de que são as pessoas mais odiadas do país.”
Sebastião Coelho da Silva, desembargador aposentado e advogado de Aécio
PGR diz que golpe é “página virada” na história do Brasil
Em sua sustentação oral, o subprocurador Carlos Frederico Santos, responsável pelas investigações do 8 de janeiro, afirmou que as acusações foram feitas na “melhor técnica jurídica” e sob a tese de crimes multitudinários —ou seja, cometidos por uma multidão—, por isso todos são responsáveis pelo resultado.
“Responde pelo resultado a multidão, a turba, aquele grupo de pessoas que mantiveram um vínculo psicológico na busca de estabelecer um governo deslegitimado e inconstitucional”, disse Santos.
Santos também afirmou que o objetivo dos atos era derrubar um governo eleito sob pretexto de “fraude” nas urnas, o que não ocorreu. O subprocurador disse ainda que a PGR buscará responsabilizar todos que fomentaram as manifestações golpistas.
“É importante registrar que o Brasil há muito deixou de ser uma República das Bananas e hoje goza de prestígio das grandes democracias. Golpe de Estado é uma página virada na nossa história. Hoje, inicia-se um novo marco na história brasileira.” – Carlos Frederico Santos, subprocurador-geral da República