A adolescente Kaylanne Timóteo Freitas, de 15 anos, se recupera em casa após ter parte do braço amputada por causa do ataque de tubarão que aconteceu na Praia de Piedade, em Jaboatão dos Guararapes, no Grande Recife. “Eu sobrevivi e essa é a minha maior vitória”, disse a jovem, nesta quinta-feira (16), em entrevista à TV Globo (veja vídeo abaixo).
Kaylanne foi atacada pelo tubarão por volta das 12h30 de 6 de março, dia do feriado da Data Magna de Pernambuco. A jovem estava nadando com os amigos por um trecho da praia quando foi surpreendida pela mordida do animal, ainda quando ela estava no primeiro mergulho.
“Depois de dez minutos, eu senti duas pressões. Até pensei: ‘tem alguma coisa aqui’. Na hora, eu achei que era alguém brincando porque tinha muita gente ao meu redor”, afirmou a adolescente.
Ela contou que tomava banho de mar frequentemente no local e se sentia segura por causa da presença dos arrecifes. “Ali, é considerado uma área segura, sempre foi”, afirmou Kaylanne.
A primeira mordida foi na barriga. Nesse momento, a adolescente tentou acertar o animal com o braço, que acabou sendo mordido pelo tubarão.
“Eu ainda duvidava, pensei ‘isso não está acontecendo comigo, é um pesadelo’, achei que eu ainda ia acordar. Minha ficha só caiu na ambulância”, disse Kaylanne.
A jovem lembra que, enquanto tentava sair da água, sentiu desespero, pois não via ninguém entrar no mar para resgatá-la.
No fim, um rapaz a tirou da água. Kaylanne foi levada para a areia, onde aguardava uma ambulância. Nos minutos que passaram, ela pediu, os gritos, para que as pessoas parassem de filmar.
“Ninguém me respeitou na hora. Eu entendo que é uma coisa que todo mundo quer gravar, mostrar que está acontecendo, só que, na hora, eu não estava pensando nisso, só pensava que eu ia ficar sem braço para o resto da minha vida”, contou.
O pai da jovem, Wilque Barros Freitas, estava em casa quando a filha foi mordida pelo tubarão e foi às pressas para a Praia de Piedade assim que soube do ataque. Quando chegou ao local, Kaylanne já estava na ambulância.
“Na hora do ataque, tinha gente filmando em vez de ajudar, fora os comentários que eu vejo. Foi o que me matou por dentro”, disse Wilque.
Tratamento
Ao ser resgatada, Kaylanne já estava sem parte do braço esquerdo e foi levada às pressas ao Hospital da Restauração, no Recife, onde passou por cirurgia para reconstruir tecido, músculos e nervos rasgados pelas mordidas do tubarão.
Depois, ela passou por um tratamento com antibióticos para evitar possíveis infecções. Kaylanne disse que o pós-operatório não foi fácil, pois sentia dores para se mover e também teve crises de pânico.
A felicidade por ter recebido alta foi grande para a jovem, que estava sentindo falta da família e dos amigos. No hospital, ela ficou acompanhada pela mãe, que mora em São Paulo e voltou para cuidar da filha. “Fiquei muito aliviada, nem esperava que ia receber alta naquele dia”, declarou.
Segundo o pai da jovem, a preocupação, agora, é com a saúde mental dela. “A gente já está procurando um psicólogo para cuidar dela e alguns até se ofereceram. Fico muito feliz de ver que tem gente assim no mundo”, afirmou Wilque.
Adaptação
Um dos desafios enfrentados por Kaylanne é se adaptar às novas condições do corpo, após ter tido parte do braço esquerdo amputado. “Durante 15 anos da minha vida, eu passei com meu braço inteiro. Eu renasci e vou ter que reaprender a fazer tudo de novo”, afirmou.
Após o ataque, Kaylanne e a família se depararam com diversos comentários maldosos.
“Vi alguns comentários falando ‘ela sabia que era assim’. Se eu soubesse, eu não teria ido. Eu nunca iria planejar ficar sem a metade do meu braço”, contou a jovem.
Nas redes sociais, a família iniciou uma campanha de arrecadação do dinheiro para a compra da prótese e dos remédios para o tratamento.
Kaylanne disse que encara a nova vida com otimismo. “A gente tenta olhar pelos pontos positivos. Graças a Deus, ela está viva e isso é o que importa”, disse o pai dela.
Outros ataques
Em 5 de março, no dia anterior ao incidente com Kaylanne, a 500 metros de distância, o adolescente Claudemir Gleybson Ferreira Herculano, de 14 anos, também foi mordido por um tubarão, na área da igrejinha de Piedade.
A área onde os dois adolescentes foram atacados, próximo à igrejinha de Piedade, é considerada um dos locais com maior risco de ataque de tubarão. Nesse mesmo local, há 76 anos, um frade morreu após ser “arrastado para o fundo do mar por tubarão”.
Em Piedade, o banho de mar é proibido pela prefeitura desde 2021, quando dois homens foram atacados em menos de 15 dias e um deles morreu. Entretanto, somente no início de março de 2023 foram colocadas placas para avisar da proibição. Antes, elas alertavam apenas para os ataques.
Os incidentes com Kaylanne e Claudemir aconteceram menos de 15 dias depois que o surfista André Luiz Gomes da Silva, de 32 anos, foi mordido por um tubarão em Olinda. Ele teve ferimentos em uma das pernas, porém, não precisou amputar o membro. Recebeu alta dez dias depois do ataque.
Com esses ataques recentes, subiu para 77 o número de ocorrências envolvendo tubarões em Pernambuco, sendo 67 no continente e outras dez em Fernando de Noronha. A contagem foi iniciada em 1992, quando se registrou o primeiro caso no estado. Foram 26 mortos nesse tipo de incidente desde então (entenda, no vídeo acima, por que ataques são comuns em praias do estado).