O primeiro dia do julgamento contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outros sete aliados, realizado nesta terça-feira, 25, pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), terminou com derrotas para as defesas. A corte rejeitou todos os questionamentos processuais apresentados pelos denunciados como integrantes do “núcleo crucial” da tentativa de golpe de Estado.
Sem definição se acata ou não a denúncia da PGR, os ministros retomam o julgamento na manhã desta quarta-feira, 26. Esta será a última sessão para definir se o ex-presidente e seus aliados será colocado no banco dos réus.
O ex-presidente foi denunciado pela PGR em fevereiro. O procurador-geral da República, Paulo Gonet, apresentou denúncia contra Bolsonaro e outras 33 pessoas pelos crimes de tentativa de golpe de Estado, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, organização criminosa, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. Bolsonaro foi denunciado como líder da organização que arquitetou que colocou em andamento um plano de golpe de Estado.
Como foram denunciados pela PGR 33 pessoas, isso significa que a denúncia será julgada parcialmente nesta quarta-feira, 26. No passo seguinte, os ministros da Primeira Turma vão analisar a acusação contra o segundo e terceiro núcleo. O segundo foi denunciado como responsável pelo operacional e o terceiro responsável pelo “gerenciamento de ações” golpistas.
A Primeira Turma do STF é composta por Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Luiz Fux, Flávio Dino e Cristiano Zanin. O relator do caso é Alexandre de Moraes e o presidente é Cristiano Zanin. No julgamento da denúncia desta terça-feira, 25, o relator, ministro Alexandre de Moraes, disse que “integrantes do alto escalão do governo federal e das forças armadas formaram o núcleo crucial da “organização criminosa”. “Deles partiram as principais decisões e ações de impacto social narradas na denúncia”.
O ministro relator citou que a consumação do crime do artigo 359-M do Código Penal (tentar depor por meio de violência ou grave ameaça o governo legitimamente constituído) ocorreu por meio de sequência de atos que visavam romper a normalidade do processo sucessório.
“Esse propósito ficou evidenciado nos ataques recorrentes ao processo eleitoral, na manipulação indevida das forças de segurança pública para interferir na escolha popular, bem como na convocação do alto comando do exército para obter apoio militar à decretação que formalizaria o golpe”, leu Moraes em seu relatório.
Gritos
Durante a leitura do relatório, quando estava caminhando para conclusão, Alexandre de Moraes foi brevemente interrompido com gritos vindos de fora do Plenário. O barulho ocorreu quando o ministro mencionava os nomes do ex-presidente e outros 7 acusados pelo cometimento de golpe de Estado. No ato provocativo, o ministro escutou palavras de ordem, como: “arbitrário”.
Os gritos foram do ex-desembargador Sebastião Coelho, atual advogado de Felipe Martins – que também foi denunciado pela tentativa de golpe, mas não compõe o núcleo que está sendo julgado. O advogado foi detido pela Polícia Judiciária e conduzido a área interna do STF para fazer boletim de ocorrência. Após a breve interrupção, Moraes concluiu a leitura do relatório e passou a palavra ao procurador-geral da República, Paulo Gonet.
Denúncia da PGR

Em discurso firme, o procurador-geral buscou chamar a atenção para a gravidade do plano golpista e para o risco que ele representou à democracia do País. As provas consideradas mais contundentes foram citadas em diferentes passagens da manifestação, como a minuta golpista e o rascunho de discurso que seria lido por Bolsonaro após a deposição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Assim como na organização da denúncia, o procurador-geral conectou diferentes episódios que, na avaliação dele, culminaram no plano golpista. A cronologia tem origem em 2021. Ali teve o início o discurso de “ruptura institucional” capitaneado por Bolsonaro, segundo o procurador-geral. Os fatos são encadeados até o 8 de Janeiro, o “ato final” do movimento golpista, segundo a linha do tempo traçada por Gonet.
Gonet disse estar convicto da denúncia e das provas apresentadas e argumentou que os elementos reunidos são suficientes para o recebimento das acusações. “A organização tinha por líderes o próprio presidente da República e o seu candidato a vice-presidente, general Braga Netto. Todos aceitaram, estimularam e realizaram atos tipificados na legislação penal de atentado contra a existência e independência dos Poderes e o Estado Democrático de Direito”, afirmou Gonet.
O procurador-geral buscou chamar a atenção para a gravidade do plano golpista e para o risco que ele representou à democracia do País. “A organização criminosa documentou seu projeto e durante as investigações foram encontrados manuscritos, arquivos digitais, planilhas e trocas de mensagens reveladores da marcha da ruptura da ordem democrática, objeto dos esforços da organização”, disse Gonet.
“Para criar condições favoráveis ao seu propósito, o grupo registrou a ideia de estabelecer um discurso sobre urnas eletrônicas e votações e de replicar essa narrativa novamente e constantemente a fim de minar a credibilidade do provável resultado eleitoral desfavorável […]. A organização criminosa esbanjava acusações falsas, mirabolantes e manipuladoras nas redes sociais e meios de comunicação”, acrescentou em outro trecho o PGR.
Defesa de Bolsonaro

A defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), representada pelo advogado Celso Vilardi, apresentou seus argumentos aos ministros da Primeira Turma. Em sustentação oral que durou cerca de 15 minutos, o advogado disse que a denúncia da PGR contra Bolsonaro não tinha objeto específico e defendeu a rejeição. Ele ainda critica delação de Mauro Cid e negou a participação de Bolsonaro no golpe.
“Foram determinadas buscas e apreensões, foi feita a quebra de nuvens, o presidente foi investigado, buscas e apreensões. O que se achou com o presidente? Absolutamente nada. E com todo o respeito e com toda a vênia, ilustre procurador-geral da República, eu contesto essa questão do documento achado do Partido Liberal. Há, inclusive, no meu colega Paulo Bueno, uma ata notarial de que ele enviou para o presidente da República aquele documento. Então, esse documento não foi achado. Com o presidente não se achou absolutamente nada”, enfatizou o advogado de Bolsonaro.
A sustentação de Vilardi também foi no sentido de criticar a delação de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro. “Nem a Polícia Federal que se utilizou dessas possibilidades, afirmou a participação dele no 8 de Janeiro. Não há um único elemento, nem da delação. Aí me criticam que eu digo que a delação não vale nada, óbvio, porque nem o delator que o acusou fez qualquer relação dele com o 8 de Janeiro. Não há uma única evidência a esse respeito”, afirmou Vilardi.
“Eu entendo a gravidade de tudo que aconteceu no 8 de janeiro, mas não é possível que se queira imputar a responsabilidade ao presidente da República o colocando como líder de uma organização criminosa quando ele não participou dessa questão do 8 de janeiro. Pelo contrário, ele a repudiou”, acrescentou em outro trecho da sustentação o advogado.
Presidente acompanhou julgamento

Pegando todos de surpresa, o ex-presidente Jair Bolsonaro decidiu acompanhar presencialmente a primeira sessão do Supremo Tribunal Federal (STF) na análise sobre a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra ele e sete de seus aliados. Sentado na primeira fileira, Bolsonaro ficou frente a frente com o ministro Alexandre de Moraes, relator do caso. De dentro do Plenário, Bolsonaro se manifestou publicamente uma única vez.
Julgamento do núcleo central
O julgamento será retomado nesta quarta-feira, 26. Caso a denúncia seja aceita, será aberta uma ação penal e os oito denunciados, que formam o Núcleo 1 apresentado pela PGR, tornam-se réus e respondem ao processo no STF. O Núcleo 1 é assim chamado pois é apontado pela PGR como responsável por liderar a tentativa de impedir o terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, após as eleições de 2022.
Veja quem são os denunciados do Núcleo 1:
- Jair Bolsonaro, ex-presidente da República, ex-deputado, ex-vereador do Rio de Janeiro e capitão da reserva do Exército;
- Alexandre Ramagem, deputado federal, ex-diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e delegado da Polícia Federal;
- Almir Garnier Santos, almirante da reserva e ex-comandante da Marinha do Brasil;
- Anderson Torres, ex-ministro da Justiça do governo Jair Bolsonaro, e ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal, à época dos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023;
- General Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional e general da reserva do Exército;
- Mauro Cid, ex-ajudante de ordens da Presidência, tenente-coronel do Exército (afastado das funções na instituição);
- Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa, general da reserva e ex-comandante do Exército; e
- Walter Souza Braga Netto, general da reserva do Exército, foi ministro da Defesa e da Casa Civil, além de candidato a vice de Bolsonaro em 2022.
Preliminares
Antes de concluir o julgamento desta terça-feira, os ministro rejeitaram cinco preliminar apresentadas pela defesa dos denunciados. A 1ª preliminar rejeutada apresentada pelas defesas foi para declarar Moraes, Dino e Zanin impedidos de atuar no caso, por ausência de imparcialidade. Todos os ministros votaram contra.
A segunda questão preliminar analisada foi sobre a competência do STF para julgar o caso, isto é, se o caso deveria ser julgado por outras instâncias. Também houve o questionamento sobre o caso ser julgado pela 1ª Turma e não pelo plenário do STF. Por maioria os ministros rejeitaram.
A terceira questão preliminar analisada e rejeitada foi sobre os pedidos de nulidade do julgamento, apresentados pelas defesas dos acusados e que questionavam o procedimento investigativo que levou à denúncia enviada pela PGR ao STF.
A quarta preliminar, rejeitada de maneira unânime, foi um pedido feito pela defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro pela aplicação das regras do ‘juízo de garantias’, em o advogado Celso Vilardi aponta a necessidade de prever um juiz para a fase anterior à denúncia, e outro para a fase do julgamento.
Por fim, a última preliminar analisada pela Primeira Turma do STF foi a nulidade do acordo de delação premiada firmado entre a Polícia Federal e Mauro Cid. A turma rejeito por unanimidade.
Julgamento dos próximos núcleos
Depois de julgada o primeiro núcleo, a próxima sessão de julgamento da denúncia da PGR ocorre em 8 e 9 de abril. Nesta data está marcado o julgamento do terceiro núcleo. O grupo reúne 11 militares da ativa e da reserva do Exército e um policial federal suspeitos de terem promovido ações táticas para levar a cabo um golpe. Já nos dias 29 e 30 de abril a acusação será contra o segundo núcleo, o operacional, com seis pessoas.
Fazem parte do segundo grupo os ex-assessores de Bolsonaro Filipe Martins e Marcelo Câmara, o ex-diretor da Polícia Rodoviária Federal Silvinei Vasques, o general Mário Fernandes, a ex-subsecretária de Segurança do Distrito Federal Marília de Alencar e o ex-secretário-adjunto da Secretaria de Segurança do Distrito Federal Fernando de Sousa Oliveira.