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Um tiro na história: morte de Vargas faz 70 anos

O Brasil lembra hoje, 24 de agosto, o maior trauma da vida nacional no século 20: o suicídio do presidente Getúlio Vargas.

 

Ele matou-se há 70 anos, com um tiro no coração, “saindo da vida para entrar na história”.

Passadas sete décadas, segue como um ícone da política brasileira e uma personagem controversa da história, sendo considerado o maior político da República.

Foi o presidente que passou mais tempo no poder: quase 20 anos. Governou em dois períodos (1930 a 1945 e 1951 a 1954).

Foi político a vida inteira, até à hora da morte.

O tiro que lhe estraçalhou o coração, naquela manhã trágica de 24 de agosto de 1954, foi também um gesto político radical que alvejou brutalmente seus adversários.

O presidente encerrou sua carreira política e deu fim à sua vida com sangue, no auge de uma campanha difamatória movida contra ele pelas oposições.

À época, elas eram comandadas pela União Democrática Nacional (UDN), que aglutinava em torno de si as elites brasileiras e não aceitava a política econômica de seu governo.

Quando se matou em seus aposentos, no Palácio do Catete, no Rio de Janeiro, tinha 72 anos.

Um projeto de Brasil

O presidente iniciou o processo de modernização da economia do país. Durante seu governo, o Brasil deixou de ser agrário e começou a se industrializar.

No início dos anos 30, com a queda no preço do café, a economia inicia um novo clico de reorganização.

A indústria voltada para o mercado interno ganhou força. Getúlio estimulou também a formação de uma indústria de base.

Avanços e sobressaltos

Ao tempo em que dava saltos nas áreas econômica e social, procurando vencer o subdesenvolvimento, o governo de Vargas enfrentava graves crises no campo político.

Dois anos depois de ter assumido o poder, Getúlio ainda não tinha cumprido a promessa feita durante a revolução de 1930 de convocar uma Assembleia Nacional Constituinte.

Setores das oligarquias paulistas, em oposição ao governo, saíram à praça pública cobrando a instalação da Assembleia.

Chamado de Revolução Constitucionalista de 1932, esse movimento foi reprimido com violência por tropas federais.

A nova constituição só foi promulgada em 1934. Durou pouco. Foi revogada em 1937, quando o presidente aplicou o golpe que iniciou o período ditatorial.

O Congresso Nacional foi fechado. Uma nova constituição foi outorgada e o estado de sítio, decretado.

Getúlio criou em 1939 o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), que cuidava da publicidade oficial e da censura à imprensa.

O retrato perfeito de um ditador

Getúlio Dorneles Vargas, gaúcho de São Borja, nasceu em 19 de abril de 1893.

Ele veio ao mundo no mesmo ano do nascimento do italiano Benito Mussolini e no mesmo mês de Adolfo Hitler.

É, pois, de uma safra de ditadores do século 20 que se completa com Salazar (Portugal), Perón (Argentina), Franco (Espanha) e Stálin (Rússia) – alguns um pouco mais jovens e outros um pouco mais velhos que o caudilho brasileiro.

Getúlio chegou à presidência através da Revolução de 1930, aos 47 anos de idade.

Concorrendo pela oposição, ele havia perdido a eleição presidencial para o paulista Júlio Prestes, candidato do governo.

Comprovaram-se o uso da máquina governamental e fraude nas eleições, combatidos com o Golpe de 30.

Com a instalação do governo revolucionário, começou o processo de reorganização do Estado através de intervenções, novos ministérios (como o do Trabalho e o da Educação) e uma legislação social inovadora.

No poder, Getúlio reelegeu-se facilmente em 1934. Três anos depois, deu um novo golpe e implantou o Estado Novo.

A partir de então, passou a exercer o poder de forma cada vez mais arbitrária. Os brasileiros viveram um misto de massificação e autoritarismo.

Getúlio e a Guerra

A II Grande Guerra Mundial (1939 -1945|) pegou Vargas no poder.

Dizia-se que o presidente hesitava diante do conflito. Entendeu-se, depois, que até 1940 o Brasil procurava, na verdade, uma “equidistância pragmática”.

Essa posição do governo brasileiro permitiu ao país barganhar tanto com a Alemanha quanto com os Estados Unidos.

Por um tempo, o Brasil flertou com a Alemanha, ao ponto de entregar a mulher do comunista Luiz Carlos Prestes aos nazistas, episódio retratado no livro “Olga”, do jornalista Fernando Morais e no filme homônimo, lançado em 2004, nos 50 anos da morte de Getúlio.

O fato é que o Brasil entrou na guerra em agosto de 1942.

O presidente declarou estado de guerra contra a Alemanha e a Itália.

Em novembro de 1943, criou a Força Expedicionária Brasileira.

Em julho de 1944, os primeiros pracinhas seguiram para os campos de batalha italianos.

O presidente mandou 25.000 homens defender na guerra a democracia que aqui não existia.

Os feitos e os malfeitos de Getúlio

Em 1940, Getúlio instituiu o salário mínimo e, três anos depois, entrou em vigor a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT);

Dela constavam resoluções tomadas desde 1930 na área trabalhista, como a limitação a 8 horas da jornada diária na indústria.

Em 1952, já no governo democrático, criou a Carteira de Trabalho.

O presidente criou a Legião Brasileira de Assistência (LBA), avó do Bolsa Família.

Ele governou com mão de ferro até 29 de outubro de 1945, quando foi deposto.

A redemocratização do país, no governo Dutra, deu-se com o cerceamento da plena liberdade sindical, o fechamento do Partido Comunista e o alinhamento do Brasil com a política norte-americana.

A volta por cima em 4 anos

Apeado da presidência, Getúlio Vargas retirou-se para sua fazenda, em São Borja, e lançou o manifesto que abriria caminho para a sua volta triunfal ao poder: “Em todos os momentos decisivos de minha vida pública, sempre procurei pairar acima das paixões e choques personalistas, pensando somente no bem da pátria”.

Vargas fora deposto em outubro de 1945, mas deixou a chefia do País de forma pacífica, mantendo seus direitos políticos.

Em 1950, lançou-se candidato à presidente pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB).

Venceu pelo voto com seu projeto nacional-desenvolvimentista que valorizava o trabalhador, fomentava a indústria e fortalecia a soberania nacional.

Seu retorno ao poder, por meio do voto popular, cinco anos após ter deixado o cargo como ditador, foi um expressivo sinal de que o povo brasileiro apoiava a política varguista.

Foi justamente no segundo Governo Vargas, em 1953, que o Brasil viu nascer sua maior e mais importante estatal até hoje, a Petrobrás.

O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE), atual Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), também foi fundado nesse período – em junho de 1952 –, assim como o Banco do Nordeste, criado no mês seguinte.

Além disso, regulamentou o trabalho do menor aprendiz e aprovou a lei de liberdade de imprensa.

O reajuste do salário mínimo em 100%, realizado pelo ministro do Trabalho João Goulart, foi um dos motivos para que civis e militares antigetulistas articulassem o golpe.

Na iminência de ser deposto pela segunda vez, numa atitude extremada e assustadoramente consciente, Getúlio atira contra o próprio peito.

A Era Vargas

A Era Vargas corresponde ao período em que Getúlio Vargas (1882-1954) governou o Brasil em três momentos: Governo Provisório: 1930-1934; Governo Constitucional: 1934-1937 e Estado Novo: 1937-1945.

Vargas procurou desenvolver o Brasil incentivando a entrada controlada de capital estrangeiro e protegendo a indústria nacional.

A oposição udenista representava setores da economia ligados ao capital externo e combatia abertamente a política do governo.

Vinculada a grupos empresariais que viviam da venda de produtos importados, a UDN não se entusiasmava com a ideia da industrialização do país.

Também estava assustada com a crescente aproximação de Getúlio Vargas dos trabalhadores.

Como as elites econômicas e a classe média lhe davam as costas, o presidente procurou apoio na classe trabalhadora.

O apoio popular não foi suficiente, no entanto, para respaldar a sua política econômica.

A UDN e as elites dominantes preparavam um golpe contra Vargas, que já enfrentava grande desgaste popular.

O suicídio do presidente foi um contragolpe, pois abortou o plano de seus adversários de tomarem o poder à força.

Com o seu gesto extremo, o presidente despejou nas ruas multidões de trabalhadores.

Estas carregavam seu caixão como um herói nacional e marchavam enfurecidas contra os adversários do presidente.

O varguismo não morreu

São heranças da administração getulista, por exemplo, a Petrobras, a Companhia Vale do Rio Doce, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), além de conquistas sociais como a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), o salário mínimo e o voto feminino.

Getúlio era chamado por seus simpatizantes de “pai dos pobres” pela legislação trabalhista e políticas sociais adotadas em seus governos.

A sua doutrina e seu estilo político foram denominados de “getulismo” ou “varguismo”, cuja base era o desenvolvimento nacional a partir de uma política de colaboração de classes.

Com sua forte centralização política, criou importantes estatais: Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), Companhia Vale do Rio Doce, Hidrelétrica do Vale do São Francisco, Petrobras e Eletrobras, além de agências como o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Apesar de sua ausência física, Getúlio está presente com relevo nestas sete décadas de história do Brasil através de suas ideias.

O grande debate político sobre a modernização do país, que se seguiu à sua morte e se arrasta até os dias atuais, deu-se nos limites propostos pelo ex-presidente: qual seria o verdadeiro papel do Estado, da iniciativa privada nacional e do capital estrangeiro na industrialização brasileira?

O presidente virou tema de livros, filmes, documentários, estudos, pesquisas, nome de ruas, cidades e instituições.

E muito ainda vai-se ouvir falar em sua figura e em seu legado pelas próximas décadas.

Fonte: zozimotavares.com

 

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