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Em livro, ex-procurador da Lava Jato critica delações da PGR

Em um livro de entrevistas sobre os bastidores da Operação Lava Jato, o decano da força-tarefa da Lava Jato de Curitiba, o ex-procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, apontou falhas nas delações premiadas conduzidas pela equipe do então procurador-geral da República Rodrigo Janot envolvendo gravações de áudio de políticos e fez uma avaliação sobre a derrocada das investigações.

 

A entrevista com o ex-procurador integra o livro “Lava Jato: Histórias dos Bastidores da Maior Investigação Anticorrupção no Brasil”, organizado pela advogada e jurista Ligia Maura Costa, que será lançado na próxima segunda-feira (4) em São Paulo, na Livraria da Vila do Shopping Pátio Higienópolis, a partir das 19h. A obra inclui entrevistas com investigadores, magistrados, advogados e membros da sociedade civil que atuaram ou acompanharam de perto a operação.

Carlos Fernando dos Santos Lima se aposentou do Ministério Público Federal e atualmente trabalha como advogado e consultor em compliance. Antes da Lava Jato, ele havia trabalhado na investigação do caso do Banestado, uma espécie de embrião da investigação posterior, na qual o doleiro Alberto Youssef assinou seu primeiro acordo de delação.

Livro “Lava Jato: Histórias dos Bastidores da Maior Investigação Anticorrupção do Brasil” traz entrevistas com personagens que atuaram no caso Imagem: Reprodução

Em sua entrevista, Carlos Fernando disse à autora que as forças-tarefas de Curitiba e do Rio tinham critérios mais cuidadosos para a celebração das colaborações premiadas, que não foram seguidos pela PGR (Procuradoria-Geral da República) na época.

“As colaborações da PGR não seguiram os mesmos protocolos e cuidados. Houve um excesso de voluntarismo, de vontade. Sempre digo para os procuradores que, quando se está com vontade demais, é hora de dar um passo para trás e olhar a perspectiva, porque às vezes as pessoas acenam uma prova que atinge a psique do procurador. Todo procurador quer um bom resultado, em um grande caso. Então ao pegar um Sérgio Machado gravando Sarney, Renan e Jucá -acho que eram esses os nomes- aquilo chacoalha na frente do procurador, que fica hipnotizado” Carlos Fernando dos Santos Lima, ex-procurador da Lava Jato de Curitiba

Uma das gravações de Sérgio Machado resultou, na época, na demissão do então ministro da Casa Civil Romero Jucá (MDB-RR). Em um diálogo, ele falava sobre barrar as investigações da Lava Jato com um “grande acordo nacional, com o Supremo, com tudo”.

Na entrevista, Carlos Fernando lembra o acordo assinado com o ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró, que tinha uma gravação de áudio do então senador Delcídio do Amaral (ex-PT_MS), à época líder do governo Dilma Rousseff, falando sobre a possibilidade de conseguir uma possível mesada para que Cerveró desistisse da delação. O caso resultou na prisão de Delcídio.

“Apesar de termos assinado, esse acordo foi feito à nossa revelia. Até nos insurgimos, deixando claro ao PGR que tínhamos que ao menos participar, em acordos com acusados nos nossos casos. E não foi o caso do acordo do Cerveró. Eles trouxeram o acordo de cima para baixo. Lá também tem, novamente, uma gravação ambiental, que hipnotizou o PGR para assinar o acordo. Como no próprio caso da JBS, novamente com uma gravação ambiental. Essas gravações ambientais são provas às vezes muito midiáticas, mas não representam uma grande capacidade de desdobramento investigativo. É preciso ter noção daquilo que tem potencial de gerar investigações sustentáveis e daquilo que é só notícia” Carlos Fernando dos Santos Lima, ex-procurador da Lava Jato de Curitiba

Procurado, o ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot afirmou que não iria se manifestar sobre as declarações de Carlos Fernando.

O decano da extinta força-tarefa também faz reflexões sobre a derrocada da investigação e a reação do mundo político, comparando com o que ocorreu após a Operação Mãos Limpas na Itália.

Ele não chega a ser questionado sobre os diálogos dos procuradores da força-tarefa com o juiz Sergio Moro, revelados na “Vaza Jato”, nos quais há referências, no aplicativo de mensagens Telegram, à combinação de atos processuais entre procuradores e o juiz —o que é ilegal por ferir a paridade de armas do processo penal e gerou anulação de processos.

Sem citar esses diálogos, Carlos Fernando avalia que “talvez” o erro da força-tarefa foi não perceber o momento de desacelerar as investigações e “pousar o avião”. Com isso, ele diz que o sistema político uniu forças para reagir contra as investigações. “Talvez tenhamos querido mudanças demais, o que não é fácil de conseguir no nosso ambiente democrático institucional. Por isso, a Lava Jato luta pela sobrevivência e muitos procuradores lutam para manter inclusive a própria carreira”, afirmou.

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