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Facção domina Porto de Galinhas e toca terror em polo turístico de PE

O cenário exuberante das praias e das piscinas naturais de Porto de Galinhas, no município de Ipojuca (PE), esconde a atuação de uma facção criminosa que domina o tráfico de drogas no balneário. Por ano, o grupo chega a faturar R$ 10 milhões, segundo anotações obtidas pela polícia.

 

A facção impôs uma lei de silêncio entre moradores para conter denuncias à polícia. Quem foge à regra, é torturado e pode até ser morto. Além de cooptar jovens para o crime, a facção abriu um tentáculo para entrar na política, segundo investigação.

Quem são e como atuam

A Trem Bala/ CLS (Comando Litoral Sul) foi criada em meados de 2019, quando chegou ao auge e mudou a rotina de Porto, segundo o promotor de Justiça Rodrigo Altobello, que atua em Ipojuca.

A facção tem relação estreita com o CV (Comando Vermelho), maior fornecedor de drogas para o grupo.

Dos R$ 10 milhões que o grupo chega a faturar por ano, R$ 200 mil são só para compra de armas de fogo. O grupo também é conhecido por ações ousadas, como a explosão ao presídio de Limoeiro para resgatar presos e a compra de armas roubadas da própria polícia.

A polícia já realizou várias operações e prisões contra a facção. Porém, o grupo segue vivo e atormentando a população local.

No último sábado, um tiroteio na comunidade Salinas deixou três mortos e alguns feridos durante uma ação policial. A polícia recebeu denúncias de moradores da comunidade que estavam ameaçados pela facção. A ação ainda resultou na apreensão de drogas e armas.

“Porto de Galinhas tem um movimento muito grande. Apesar de ser um crime sem grave ameaça, o tráfico gera uma série de consequências e muda a dinâmica da violência. Facções também diversificam a fonte de renda, praticam outros crimes; e quando tem tráfico, tem usuário que não paga e que vai assaltar. Onde os grupos atuam, impõem lei de silêncio.” – Rodrigo Altobello, promotor de Justiça

A CLS chegou a disputar espaço em meados de 2019 e 2020 com a PCI (Primeiro Comando de Ipojuca), mas superou e “tomou” Porto. O PCI era parceiro do PCC. Hoje, muito também por conta da atuação policial, o PCI praticamente não existe mais. “Sabemos que a CLS tem ligações também com o PCC”, diz o promotor.

Praia de Porto de Galinhas é a que recebe maior número de turistas em Pernambuco Imagem: Ministério do Turismo

“Quem fala aqui com a polícia, morre”, diz comerciante

Um empresário, em condição de anonimato, disse ao UOL que os moradores em Porto conhecem a atividade ilegal do grupo, mas temem ser vítimas dela. “Eu conheço vários deles [integrantes], os vejo todo dia no meu negócio. Mas se você não fizer nada errado, eles não mexem com você e até te defendem, se necessário.”

O comércio de drogas, diz o empresário, ocorre com naturalidade em Porto há tempos.

“Em hotéis e restaurantes indicam onde comprar [droga]. É um tráfico bem organizado.” – Empresário

Ele afirma ainda que o grupo nunca cobrou valores dele e não mexe com turistas, mas tem uma ordem clara a todos que atuam com comércio: “não é para dar conversa a policiais.”

“Se eles pegam passando informação, conversando com policiais, matam. Quem fala aqui, morre. Isso aqui a gente já viu muito e sabe que é assim.” – Empresário

Imposição pela violência

Ao longo de três anos, a Polícia Civil investigou a atuação do grupo, que conseguiu prender os chefes e entender o funcionamento do grupo. A operação Manguezal Vermelho, realizada em junho, foi a maior contra a facção e prendeu 24 pessoas. Ela resultou, em seguida, no indiciamento de 50 suspeitos.

“A investigação começou em 2020 e foi longa e complexa porque o grupo impõe medo a empresários e moradores. Pessoas que passavam informações à polícia costumam ser vítimas do tribunal do crime. Mas conseguimos demonstrar a conduta de cada um desses 50 investigados.” – Ney Luiz, delegado de Porto de Galinhas

Material apreendido na operação Manguezal Vermelho Imagem: Polícia Civil de Pernambuco

O nome da operação é uma referência à tortura e assassinato de pessoas pela facção, e que eram enterradas em uma espécie de cemitério clandestino no mangue.

A violência extrema do grupo é uma marca e chamou a atenção das autoridades. Em um dos casos investigados, a polícia recebeu a informação que uma jovem foi sequestrada de sua casa, torturada, morta e enterrada de cabeça para baixo no mangue.

O delegado afirma que o grupo costumava matar rivais que tentavam tomar território, pessoas que a denunciaram à polícia e até aqueles que praticavam crimes patrimoniais nas comunidades.

Porto de Galinhas tem índices de violência “bastante baixos” e casos de roubos e homicídios são “atípicos”, segundo o delegado. “Com as últimas operações de prisão de lideranças, a gente já percebe a diminuição de crimes.”

Ele explica que os recentes assaltos a pousadas estavam sendo praticados este ano por um único homem da facção, que realizou seis roubos. “A gente tinha achado em 2020 um caderno com anotações do tráfico, que citava ele como o contador da facção. Recentemente, investigando esses roubos, identificamos e prendemos ele, que agia sozinho.”

“Ali, como qualquer litoral, o consumo de drogas é alto, mas com as prisões a gente deu uma desestabilizada. Não podemos dizer que ela acabou, mas ela não está tendo sossego.” – Cláudio Neto, delegado chefe do Denarc (Departamento de Repressão ao Narcotráfico)

Facção usa YouTube

Postagem no Youtube com arma e munições da CLS Imagem: Reprodução

A coluna encontrou canais no YouTube da facção, com vídeos e músicas em que criminosos vangloriam-se pelo domínio de áreas e dos crimes praticados contra rivais.

Além de muitas armas, a facção exibe dinheiro adquirido por crimes cantando raps. Não é a primeira vez que facções usam a rede para proliferar ideais criminosos, como revelou matéria do UOL em março.

Em uma das canções, a CLS comemora a ação de explosão ao muro do presídio de Limoeiro, ocorrido em 2020, que fez com 27 detentos fugissem. O caso é tratado como um ato de “heroísmo dos irmãos.”

À época, secretário de Justiça e Direitos Humanos de Pernambuco, Pedro Eurico, classificou a ação como a mais ousada em Pernambuco em 10 anos.

Em 2021, ela foi uma das facções que comprou armas roubadas da Core (Coordenadoria de Recursos Especiais ) da Polícia Civil de Pernambuco.

Nos vídeos, o grupo afirma que conseguiu se expandir por outros municípios da zona da mata sul.

“A facção tem sua base em Porto. Em termos de região metropolitana, ela é a que nos dá mais trabalho, porque não é só naquela região que ela atua –lá ela domina só. Porto de Galinhas tem maior repercussão porque é um ponto turístico.” – Cláudio Neto, delegado chefe do Denarc

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