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Mendonça pede vista, e STF adia decisão sobre marco temporal indígena

O ministro André Mendonça, do STF (Supremo Tribunal Federal), pediu vista (mais tempo de análise) e suspendeu mais uma vez o julgamento do marco temporal após o caso ficar parado por quase dois anos na Corte. Antes, o ministro Alexandre de Moraes votou contra a tese.

Discussão é adiada

André Mendonça anunciou que iria pedir vista (mais tempo de análise) logo depois do voto de Alexandre de Moraes, único a votar na sessão de hoje. É a segunda vez que a discussão, iniciada em 2021, é adiada.

O placar está em 2 a 1 contra o marco temporal. Em 2021, o relator, Edson Fachin votou contra a tase. Moraes acompanhou o colega hoje.

Na divergência, está, até o momento, o ministro Nunes Marques, indicado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), que é favorável ao marco temporal.
Ao pedir vista, Mendonça classificou o voto de Moraes como “bastante robusto” e disse que precisa de “maior reflexão” sobre a matéria. O ministro se comprometeu a liberar o processo “em um prazo comum”.

Desde janeiro, ministros que pedem vista devem devolver os casos para julgamento em até 90 dias. Caso não o faça, o processo é liberado automaticamente.

Com isso, a discussão do marco temporal pode ficar para depois de setembro — mês em que se aposenta Rosa Weber, presidente do Supremo.

A ministra relembrou o prazo e cobrou Mendonça que devolva o processo antes de sua saída. Para ela, o tema é de imensa sensibilidade e “toda reflexão se mostra oportuna”. Rosa, porém, deixou claro que espera votar antes de se aposentar. Havia uma expectativa de que ela antecipasse o voto caso o julgamento fosse suspenso hoje.

“Eu só espero – e tenho certeza que vai acontecer – que eu tenha condições de votar, porque eu tenho uma limitação temporal para proferir o meu voto.” Rosa Weber, presidente do STF

Interlocutores de Mendonça avaliam que o ministro deverá devolver o processo antes da aposentadoria de Rosa. Ao envolver

Antes da sessão, o ministro Edson Fachin afirmou que a decisão do Supremo sobre o marco temporal vai definir “parte substancial do futuro do país”.

Moraes vota com Fachin e é contra marco temporal

Moraes acompanhou o voto do relator, Edson Fachin, pontuando algumas mudanças na proposta da tese a ser formada pela Corte.

Para o ministro, a União deve indenizar integralmente o proprietário que, de boa-fé, adquiriu uma terra tradicional indígena antes da data da Constituição. Nos casos após o marco, a indenização deve ser apenas em benfeitorias.

Em casos impossíveis de se fazer a demarcação, como em situações de cidades construídas em cima de uma terra tradicional, a União deve compensar as comunidades tradicionais concedendo terras equivalentes às tradicionalmente ocupadas, desde que haja concordância.

Segundo Moraes, houve falhas do poder público na demarcação dessas terras.

“Não é culpa das comunidades indígenas, que tem o seu direito à posse das terras. Não é culpa do agricultor, do colono, que tem direito a indenização. É culpa do poder público, que regulamentou ora de um jeito, ora de outro” Alexandre de Moraes, ministro do STF

Moraes afirmou que a discussão do marco temporal é uma das “questões mais difíceis” não apenas no Brasil, como no mundo.

Para o ministro, há um quadro de insegurança jurídica que afeta a paz social em razão da falta de uma interpretação definitiva sobre o tema.

“Essa insegurança jurídica, essa intranquilidade social, que acaba resultando em violência entre comunidades indígenas e pessoas do campo, permanece nos dias de hoje, quase 35 anos da Constituição Federal” Alexandre de Moraes, ministro do STF

Lideranças indígenas acompanham no plenário

Lideranças indígenas de 21 etnias acompanham o julgamento do plenário do Supremo, que reservou 50 cadeiras para as comunidades tradicionais, assim como ocorreu em 2021.
Inicialmente, a sessão também seria transmitida em um telão na Praça dos Três Poderes, mas o Governo do Distrito Federal vetou a iniciativa. O STF cedeu um espaço na área externa, mas não houve tempo para os indígenas instalarem o equipamento.

O que é o marco temporal

A tese do marco temporal estabelece que os povos indígenas só podem reivindicar terras que ocupavam à época da promulgação da Constituição, em outubro de 1988. A discussão opõe ruralistas e mais de 170 povos indígenas, que criticam a tese e defendem a sua derrubada.

A decisão do STF no caso terá repercussão geral, ou seja, servirá para solucionar disputas judiciais sobre o tema em todas as instâncias do país. Em 2021, quando o julgamento foi suspenso, o placar estava 1 a 1. O ministro Edson Fachin, relator, votou contra o marco temporal. Nunes Marques, indicado por Jair Bolsonaro (PL), votou a favor.

 

O caso específico em discussão na Corte envolve uma disputa entre o governo de Santa Catarina e indígenas do povo xokleng, que reivindicam um território na região central do estado. Em janeiro de 2009, cerca de cem deles ocuparam uma área onde hoje está a reserva biológica do Sassafrás, uma área de proteção ambiental. O governo pediu a reintegração de posse, e obteve em primeira instância, mas a Funai recorreu e o caso chegou ao Supremo em 2016.

Indígenas vão assistir a julgamento por telão
Imagem: Pedro Ladeira/Folhapress

O que é o projeto de lei no Congresso

Além do julgamento no STF, o marco temporal é tema de proposta no Congresso. Na semana passada, a Câmara aprovou um projeto de lei que estabelece a tese para demarcação de terras indígenas — foram 283 votos a favor, 155 contra e uma abstenção.

A proposta foi enviada para análise do Senado. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), já sinalizou que o texto deverá ter uma tramitação lenta na Casa.

A aprovação na Câmara foi uma vitória da bancada ruralista sobre a agenda ambiental defendida pelo governo Lula (PT). Eleito com a promessa de fazer demarcações, o petista criou o Ministério dos Povos Indígenas.

As ações do governo, no entanto, não se refletiram no Congresso — com a falta de articulação política, os governistas não conseguiram impedir a derrota na votação. A ministra Sônia Guajajara criticou o texto.

“O PL 490 representa um genocídio legislado porque afeta diretamente povos indígenas isolados, autorizando o acesso deliberado em territórios onde vivem povos que ainda não tiveram nenhum contato com a sociedade, nem mesmo com outros povos indígenas, cabendo ao Estado brasileiro atuar também pela proteção dos territórios onde vivem estes povos.” Ministério dos Povos Indígenas

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