Com a decisão do Supremo, as emendas de relator só podem ser usadas agora para correções no projeto de lei orçamentário.
O placar terminou em 6 a 5 pela derrubada do orçamento secreto.
O ministro Ricardo Lewandowski abriu a sessão e seguiu a ala aberta por Rosa Weber, presidente do tribunal, votando contra o modelo atual das emendas do relator, mecanismo que garantiu sustentação política ao presidente Jair Bolsonaro (PL) no Congresso.
Último a votar, Gilmar Mendes divergiu e se juntou à ala que defendia a manutenção das emendas, desde que com mais critérios de transparência e distribuição de verbas.
Na prática, o resultado impõe uma derrota ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que tinha no mecanismo a principal moeda de troca para acordos políticos no Congresso.
Os principais pontos do voto de Lewandowski:
- Apesar de mudanças feitas nas regras desde o ano passado, Congresso não conseguiu cumprir exigências de transparência nas emendas de relator.
- Novas regras aprovadas pelo Congresso seriam “avanço significativo”, mas não deixam claro os critérios de distribuição entre parlamentares individualmente –líder de cada bancada poderia privilegiar deputados e senadores em detrimento de outros.
- Outro ponto é o fato de que ainda caberia aos parlamentares escolherem quais ações nas áreas de saúde, educação e serviço social, sem ingerência do Executivo.
O ministro elogiou o que chamou de “esforço louvável” de Lira e do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), em buscar corrigir as falhas do modelo das emendas de relator.
As regras aprovadas pelo Congresso na sexta-feira (16) seriam um “avanço significativo”, segundo Lewandowski.
Mesmo assim, as mudanças feitas foram insuficientes. Para o ministro, o texto não deixa claro os critérios de distribuição individual entre parlamentares — o texto diz 80% será distribuído entre as bancadas, o que abriria brechas para líderes privilegiarem um parlamentar sobre outro.
“Ela [a distribuição] não será equânime. Alguns parlamentares continuarão recebendo mais, e outros menos, sem seguir critérios claros e transparentes, abrindo espaço para barganhas políticas” – Ricardo Lewandowski
Além disso, o ministro mencionou que, apesar de 50% dos recursos das emendas serem destinadas a áreas de saúde, educação e assistência social, ainda caberia ao Congresso escolher quais projetos seriam beneficiados, sem a ingerência do Executivo.
Ala vencedora acaba com orçamento secreto
Lewandowski se juntou à ala encabeçada pela presidente do STF, ministra Rosa Weber, relatora das quatro ações, e formada pelos ministros Edson Fachin, Roberto Barroso, Luiz Fux e Cármen Lúcia.
Em voto proferido na quarta-feira passada (14), Rosa afirmou que o modelo das emendas do relator como estava posto violava princípios da transparência e do acesso à informação, além de ser usado para atender a interesses paroquiais de parlamentares, sem critérios técnicos.
O voto da ministra extinguiu o modelo que dava sustentação ao “orçamento secreto”.
O que diz o voto de Rosa, acompanhada pela maioria:
- Declara incompatível com a Constituição as práticas que viabilizaram o “orçamento secreto” — como o uso indevido das emendas do relator para inclusão de novas despesas públicas.
- Veda a utilização das emendas do relator para atender solicitações de despesas e indicações feitas por deputados, senadores e “usuários externos” – termo usado para prefeituras, por exemplo, mas que era usado para mascarar indicações de parlamentares.
- Caberá aos ministros das pastas beneficiadas com recursos consignados pelas emendas do relator orientarem a execução dos montantes registrados como emendas de relator em projetos existentes em suas respectivas áreas, afastando o caráter vinculante das indicações feitas pelo Congresso.
- Todas as unidades orçamentárias e órgãos da administração pública devem publicar dados referentes a serviços, obras e compras realizadas com verbas do orçamento secreto em até 90 dias.
Rosa ainda fixou a seguinte tese: as emendas do relator passam a ser destinadas exclusivamente à correção de erros e omissões, vedada a sua utilização indevida para o fim de criação de novas despesas ou de ampliação das programações previstas no projeto de lei orçamentária anual.
Ala derrotada queria mais transparência
Embora com votos diferentes entre si, a ala derrotada no julgamento —composta pelos ministros Nunes Marques, André Mendonça, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e Gilmar Mendes— propunha a manutenção das emendas de relator, desde que o modelo adotado fosse mais transparente em relação aos repasses.
Último a votar, Gilmar Mendes disse que não se podia “demonizar” a discussão e criticou a falta de transparência dos repasses. Apesar disso, apontou que não se podia declarar as emendas de relator inconstitucionais e restringi-las somente a ajustes na lei orçamentária.
Em voto, o decano defendeu que fossem adotadas medidas em até 30 dias para garantir a rastreabilidade e a publicidade das emendas e que tais informações sejam publicadas em até 90 dias.
Na última quinta-feira (15), os demais ministros votaram da seguinte forma:
- André Mendonça votou para o Congresso fixar em até 60 dias os fundamentos que definiriam o montante destinado às emendas do relator, além de adotar os mesmos critérios de transparência usados nas emendas de bancada e individuais.
- Nunes Marques mandava o Legislativo fazer ajustes no modelo atual para que fosse possível identificar todos os beneficiários e “padrinhos” das verbas das emendas de relator – mudança deveria ser feita em 30 dias, e valeria do orçamento de 2023 em diante.
- Alexandre de Moraes propôs o que chamou de “voto médio”: alterar o modelo das emendas de relator para que fossem adotados critérios de transparência semelhante às emendas individuais e parâmetros técnicos de distribuição entre parlamentares, como as proporções das bancadas.
- Dias Toffoli também propôs alterar o modelo: emendas deveriam ter limites de repasse e o governo federal deveria publicar lista de projetos que deveriam receber as verbas.
O que é o orçamento secreto?
Presentes desde o Orçamento de 2020, o uso das emendas de relator como moeda de troca facilitaram o trabalho do governo de Jair Bolsonaro (PL) nas negociações com as bancadas do Congresso Nacional ao serem usadas em troca de apoio político.
Desde o ano passado, contudo, a verba se tornou central em escândalos de fraudes na compra de caminhões de lixo, ônibus escolares, tratores, ambulância, entre outros.