Do ponto de vista conceitual, o conceito de “contemporâneo” pode significar: aquilo que acontece no mesmo tempo histórico; como aquilo que acontece nos dias de hoje, no momento em que se pensa, se produz. A ‘Idade Contemporânea’ teve início em 1789, com a Revolução Francesa, e sendo a poesia sobretudo uma práxis cultural, ela, em tese irá refletir, reverberar o tempo no qual é feita. Logo a poesia contemporânea irá refletir um desconforto para com o presente, o tempo de agora no qual atua e do qual é também um produto.
Focault disse que o texto inaugural da contemporaneidade foi o AUFKLÄRUNG (iluminação) de Immanuel Kant (1724-1804). Nesse texto basicamente Kant diz que as pessoas devem parar de ser tuteladas, precisam abandonar as tutelas e raciocinar. Com isso Kant teria instaurado o ETHOS da modernidade: ‘SAPERE AUDE’ (Ouse ser sábio)
Focault, pois, estabeleceu uma ponte entre Kant e Baudelaire, que resumidamente poderia ser traduzida nesses termos: O poeta deve tornar-se objeto de um trabalho: seu próprio corpo, seu comportamento, sentimentos, paixões, existência. Em resumo: O poeta (o artista) deve fazer de si mesmo uma obra de arte.
“O homem moderno, para Baudelaire, não é aquele que parte à descoberta de si mesmo, de seus segredos e de sua verdade oculta: ele é aquele que busca inventar-se a si mesmo. Esta modernidade não libera o homem em seu ser próprio; ela o restringe à tarefa de se elaborar a si mesmo”. Um outro autor, Giorgio Agamben, vai, então, dizer que “em arte/poesia ‘a forma é já parte do sentido”
Didaticamente a poesia contemporânea teria, dentre outras, estas características:
-poesia intimista
-temas cotidianos/regionais
-engajamento social e literatura marginal
-experimentalismo formal
Outra questão inerente à poesia contemporânea é o alcance do seu ‘arco temático’ que iria do erudito ao marginal. Aqui caberiam algumas ponderações:
– O popular de ontem pode ser o erudito de hoje. Ex. A poesia de Shakespeare (1564 -1616) cuja produção nós sabemos como foi feita, sem papas na língua. Esse autor topava tudo, compor por encomenda, se preocupava com a bilheteria, não tinha problema em fazer colagens com obras de outros autores. Agora, seu modo de fazer, sua linguagem foi o que o tornaria grande.
– o erudito é o que mantém ligação com a tradição clássica (Greco-romana), mas aqui também, estudando literatura comparada muita coisa à época era ‘popular’.
– Em se tratando de poesia a interface ‘popular’ precede cronologicamente a interface erudita
Harold Bloom disse que o texto literário é um ‘labirinto da influência’ de autores sobre outros e que, nesse sentido ‘Inspiração significa influência. Ser influenciado é ser ensinado. Todo leitor é sugado para dentro do labirinto de ideias”.
“a poesia é a arte da imensa maioria” (milton hatoum)
Ernâni Getirana, professor, escritor e poeta. Acaba de lançar no SALIPI o livro “Debaixo da Figueira do Meu Avô”.