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Câmara rejeita texto de PEC para mudar órgão do Ministério Público

Em uma rara derrota do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), o plenário da Casa rejeitou na noite desta quarta-feira (20) a PEC (proposta de emenda à Constituição) que, entre outros pontos, amplia a influência do Congresso no CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público).

O texto do relator Paulo Magalhães (PSD-BA) foi rejeitado pela falta de 11 votos. Foram 297 a favor e 182 contra —para passar, porém, uma PEC precisava do apoio mínimo de 308 deputados (60% de um total de 513).

Os deputados votariam o texto original, do deputado Paulo Teixeira (PT-SP), mas Arthur Lira encerrou a sessão após conversar com alguns parlamentares.
Segundo líderes do centrão, havia na contabilidade deles os votos necessários para aprovar a medida, bandeira de Arthur Lira, mas houve traições na reta final.

Lira e aliados vão tentar reorganizar o apoio para ainda tentar aprovar a medida em uma segunda tentativa, na semana que vem.

A ideia é conseguir os votos necessários com a garantia de que o texto original, que não tem apoio majoritário no Congresso, será ajustado no momento da votação dos destaques, a fase posterior à análise do texto-base.

Na saída da Câmara, Lira disse “que o jogo só termina quando acaba”, reforçando a intenção de ainda tentar aprovar a medida.

“Eu não penso em vitória nem derrota, eu acho que todo Poder merece ter o seu código de ética, todo Poder merece ter imparcialidade nos julgamentos, todos os excessos têm que ser diminuídos. Nós temos um texto principal, temos possibilidades regimentais e vamos analisar o que mudou em três votações para fazer uma análise política. O jogo só termina quando acaba.”

O vice-presidente da Casa, Marcelo Ramos (PL-AM), afirmou que a Câmara não pode ser paralisada.

“Vamos aguardar a posição do presidente, a conversa com os líderes partidários, analisar o porquê desse resultado, já que o presidente tinha muita convicção de que teria os 308 votos. Eu acho que agora tem que esperar baixar a poeira e reavaliar o que fazer, e não paralisar a Câmara por conta disso. A gente tem outras pautas importantes para o país, vamos tocando enquanto se procura uma solução para esse tema.”

A PEC é criticada por ampliar o número de indicações de Câmara e Senado no órgão, de dois para cinco, o que é visto como uma brecha para aumentar a interferência política no órgão responsável por realizar a fiscalização administrativa, financeira e disciplinar do Ministério Público e de seus membros.

Há anos que a classe política reclama de uma suposta inação do conselho em relação aos desvios de integrantes do Ministério Público e tenta emplacar propostas para interferir no trabalho do órgão.

A insatisfação com o CNMP aumentou principalmente após o início da Lava Jato, em razão da compreensão de congressistas de que o colegiado é corporativista e hesita em punir abusos de promotores e procuradores.

Os defensores da PEC alegam que é necessário promover alterações no órgão para torná-lo mais eficiente. Lira disse que a ideia visava levar ao “fim da impunidade em um órgão muito forte”.

Procuradores e promotores eram contra a medida, afirmando que Lira e o centrão promoviam uma “PEC da vingança” contra o Ministério Público, já que políticos desse grupo, incluindo Lira, foram e são alvos de investigações, principalmente na Lava Jato.

Associações de classe do Ministério Público dizem que a PEC representava uma tentativa de ingerência política no órgão que pode acabar com a autonomia e independência da carreira.

O mapa de votação na Câmara mostra que houve racha e infidelidade em praticamente todos os partidos, com exceção do PT, que votou em peso a favor do projeto (só o deputado Marcon, do Rio Grande do Sul, se absteve), Novo, PSOL, PV, que votaram fechados contra.

No PP de Lira, cinco deputados adotaram posição contrária aos interesses do presidente da Câmara —Afonso Hamm (RS), Evair Vieira de Melo (ES), Franco Cartafina (MG), Guilherme Derrite (SP) e Jerônimo Goergen (RS). Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente da República, votou a favor da PEC.

Paulo Teixeira afirmou que ainda há esperança que a Câmara aprove o texto original da PEC.

“Na verdade, o que prevaleceu nessa discussão foi uma fake news, porque tem poderes que resistem ao controle. E em uma democracia não existe poder sem controle”, disse o petista, em entrevista à TV Câmara, apesar de o Ministério Público não ser um poder.

O CNMP é composto por 14 integrantes, atores de diferentes ramos do Judiciário, do Ministério Público e da advocacia e tem histórico de arquivamento de processos de grande repercussão.

A composição heterogênea do colegiado dificulta a construção de consensos e leva ao adiamento de diversos julgamentos importantes.

Desde que iniciou as atividades, em 2005, o conselho autuou 6.150 reclamações disciplinares. Do total, 307, menos de 5%, resultaram em punição a promotores e procuradores, sendo 22 casos de demissão, pena mais dura que o CNMP pode impor.

Em meio à pressão em torno da discussão da PEC, o CNMP decidiu na segunda-feira (18) aplicar pena de demissão ao procurador Diogo Castor de Mattos, membro da antiga força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, pela contratação de um outdoor em homenagem à operação.

A medida foi vista como uma sinalização de que o órgão irá mudar sua postura de leniência, uma tentativa de diminuir o ímpeto de deputados a favor da PEC.

Lira aceitou, durante a discussão da medida, recuar em alguns pontos, entre eles estabelecer a indicação por procuradores e promotores de uma lista quíntupla para a corregedoria do conselho —cuja escolha, porém, permaneceria com o Congresso.

Após a derrota desta quarta, há possibilidade de a Câmara recuar também nesse ponto e devolver a escolha do corregedor do CNMP para a própria classe, sem interferência do Congresso.

A indicação do corregedor e o aumento das indicações do Congresso no conselho eram dois pontos considerados inegociáveis por Lira até o resultado desta quarta.

Segundo deputados do centrão, a narrativa de que a PEC aumentaria a interferência política no Ministério Público contaminou o debate. Alguns avaliaram o resultado como positivo, porém, pela percepção de que o Senado não pautaria o texto, a exemplo do que tem feito com outras propostas controversas, o que deixaria o ônus da votação somente com os deputados.

Fonte: Folhapress

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